por Eduardo Klausner

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

SENTENÇA CITADA NA AULA DE 06/02/2012, MANHÃ, PARA A TURMA DA EMERJ - CPVI B 12012, SESSÃO 12: DA QUALIDADE DE PRODUTOS E SERVIÇOS, RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO E DO SERVIÇO, RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PROFISSIONAIS LIBERAIS, COMO UM EXEMPLO DE CASO CONCRETO E COMPLEXIDADE DO TEMA ENVOLVENDO A QUESTÃO DA RESPONSABILIDADE DO PROFISSIONAL LIBERAL MÉDICO EM CIRURGIA PLÁSTICA, OBRIGAÇÃO DE RESULTADO E BELEZA, NO DIREITO DO CONSUMIDOR.

PODER JUDICIÁRIO

COMARCA DE SÃO GONÇALO

JUÍZO DE DIREITO DA TERCEIRA VARA CÍVEL

Processo n.2000.004.012376-4



S E N T E N Ç A





Vistos, etc...



       W.L.R., devidamente qualificada na inicial, ajuizou a presente ação, denominada de responsabilidade civil e indenizatória por danos morais, contra A.B. e H. C. N. S. G., ambos também qualificados na inicial, alegando, em suma, ter, no dia 28 de agosto de 1999, se submetido a cirurgia plástica realizada pelo primeiro réu, para redução dos seios e do abdome, nas instalações do segundo réu, cirurgia essa que causou-lhe lesões e danos materiais e morais. Requer a condenação dos réus à: 1) prestar assistência médica e hospitalar; 2) pagar indenização no valor equivalente a um mil salários mínimos por danos morais; 3) pagar indenização por danos matérias em valor a ser apurado em liquidação de sentença; 4) arcar com as despesas judiciais e honorários de advogado. A inicial veio acompanhada dos documentos de fls. 13-30.

       Resposta da S. DE A. E C. S. C. DE J., MANTENEDORA DO H.C.N.S.G., às fls. 33 e segs., na qual argumenta não justificar a autora seu pedido de assistência médica e hospitalar, e, no mérito, não ser o hospital responsável por eventual falha ou erro médico, uma vez que não possui qualquer relação contratual com o médico. Argumenta ainda, ter cumprido com as obrigações decorrentes da internação hospitalar, e ser exagerada a indenização pretendida. Requer ao final a improcedência do pedido autoral. Com a defesa vieram os documentos de fls. 39-42.

       Contestação de A.B. às fls. 43 e segs., na qual afirma ter procedido segundo a boa técnica cirúrgica e não ter a autora sofrido qualquer dano ou lesão, pelo contrário, ter alcançado a cirurgia os objetivos propostos. Afirma ainda ser a indenização pretendida pela autora exagerada. Requer ao final a improcedência do pedido autoral. Acompanha a defesa os documentos de fls. 68-97.

       Réplica às fls. 99-110. Audiência de conciliação às fls. 112, na qual foram juntadas oito fotografias tiradas em 22 de janeiro de 2001 e dois documentos, e se determinou que o feito passasse a correr em segredo de justiça. Decisão saneadora às fls. 121. Laudo pericial às fls. 140-173 e laudo do assistente técnico às fls. 175-205, 209-228. As partes falaram sobre o laudo e o perito respondeu a quesitos elucidativos às fls. 241, sobre os quais também se manifestaram as partes as fls. 243-251.

       Audiência de instrução e julgamento às fls. 262, na qual foram juntadas novas fotos e documentos, inclusive cópia do inquérito policial instaurado sobre os fatos discutidos nesses autos (fls. 263-304). Mais documentos foram juntados as fls. 305-323. As partes apresentaram suas alegações por memoriais se reportando as suas posições processuais (fls. 324-411). Novos documentos foram acostados às fls. 412-420, sobre os quais também foi dado vistas as partes.

Relatados, decido.

       Em primeiro lugar, é necessário esclarecer que o Juiz que presidiu a audiência de instrução e julgamento se aposentou, sendo o sentenciante seu sucessor na titularidade deste órgão judiciário.

       Em segundo lugar, processualmente se constata que foi permitido as partes produzir de maneira ampla as provas necessárias para o julgamento da lide. Assim, não há necessidade de se produzir novas provas em razão deste Magistrado não ter participado da colheita das constantes do processo, mormente que a prova trazida aos autos é eminentemente técnica.

       No mérito, analisando cuidadosamente as provas que instruem o feito, se constata que não merece acolhimento o pedido autoral, uma vez que a autora não sofreu qualquer dano ou lesão e o contrato realizado pelas partes foi integralmente adimplido.

       A autora se submeteu a cirurgia plástica para redução dos seios e do abdome. A cirurgia foi realizada e, apesar de algumas complicações no pós-operatório, conforme revelam as próprias partes, a cirurgia atingiu os objetivos propostos, ou seja, reduziu significativamente os seios e o abdome da autora e a embelezou. Essa conclusão fica evidente mediante o simples exame das fotos acostadas aos autos. A tal conclusão também chegou o perito judicial. As diversas fotos juntadas aos autos, tiradas em vários momentos, - antes, pouco após a cirurgia e anos após a cirurgia (apresentadas essas últimas em audiência) -, demonstram ter a autora ficado mais bonita após a intervenção médica.

       A beleza, sem dúvidas, é conceito e valor subjetivo, assim como o padrão estético. O conceito do belo em filosofia e estética, designa o conjunto harmônico de caracteres ou qualidades capazes de despertar na alma sentimento de prazer e admiração (Enciclopédia de Filosofia, in http://encfil.goldeye.info/microverbetes.htm#belo). O padrão de beleza feminina contemporânea tem por estereótipo as mulheres magras, sem serem magricelas, com curvas e medidas perfeitas, no padrão das medidas e dos corpos de manequins, modelos fotográficos e artistas. Basta um mero exame nas revistas de moda ou dedicadas às mulheres, ou uma rápida busca na internet, para se fazer tal constatação. A cirurgia plástica busca atender a este standard de beleza, mas se conforma a realidade do material humano sobre o qual incidirá a técnica médica existente. Assim sendo, nem sempre o cirurgião plástico conseguirá atingir o arquétipo estético sonhado por sua paciente. Por isso, a obrigação do médico é aplicar a melhor técnica para atingir a finalidade pretendida, o embelezamento. Esse embelezamento, como resultado final após a intervenção do cirurgião, deve ser considerado e avaliado levando-se em conta os valores sociais de estética e o biotipo da sua paciente. O critério de beleza, nesse caso, deve ser medido pelo possível, conforme a técnica existente e as características físicas da paciente.

       No caso em tela, o perito do Juízo e o assistente técnico do réu – a autora não nomeou assistente técnico – atestam que o cirurgião réu se valeu corretamente das técnicas médicas consagradas para a realização da cirurgia plástica contratada, e que a autora teve ganho estético, ficou mais bela após a cirurgia. Outros médicos, famosos especialistas em cirurgia plástica no RJ, atestaram espontaneamente que o tratamento instituído pelo o réu A.B. foi correto (fls. 86-88, 90-91). Por sua vez, o Conselho Regional de Medicina arquivou o procedimento administrativo instaurado para apuração de erro médico, iniciado em razão de iniciativa da autora (fls. 304), assim como foi arquivado o inquérito policial para apuração de crime (fls. 289-303). Logo, embora a autora não tenha ficado satisfeita com o resultado, as provas técnicas colhidas, tanto nesse processo cível como nos procedimentos administrativos acima citados, demonstram ser o resultado obtido o possível pela medicina.

        Deve ser ressaltado que não existe prova ou indício de que as cicatrizes da cirurgia pudessem ser mais discretas, ou serem situadas em partes do corpo da autora que pudessem restar imperceptíveis, ou localizadas de forma a serem escondidas pelos biquínis usados pela autora (ver fotos as fls. 167-168, entre outras). O perito do Juízo afirma que as incisões foram feitas nas regiões adequadas (fls. 148-149), e prova suas afirmações juntando esquemas técnicos ao laudo (fls. 169-173).

       Frise-se que a médica dermatologista que cuidou do pós-operatório da autora, uma vez que a autora não quis ser atendida no pós-operatório pelo médico réu, ao narrar no documento de fls. 418-420 o tratamento ao qual submeteu a autora para cuidar das cicatrizes da cirurgia, não menciona ou insinua ter o médico réu procedido com imperícia ou negligência. Apenas afirma ter recomendado à autora que buscasse os conselhos de outro cirurgião plástico, Dr. O. Não existe nos autos nenhum documento que prove ter a autora buscado contatar esse cirurgião, e qual a opinião dele sobre a cirurgia plástica da autora.

       Também alegou a autora em sua inicial ter o mamilo do seu seio esquerdo ficado torto e deformado após a cirurgia. Ocorre que o perito do Juízo apurou que o desvio do mamilo não existe mais, e afirma que “os mamilos estão absolutamente simétricos” (fls. 147). As fotos acostadas ao laudo comprovam a assertiva do expert. Deve ser destacado que a necessidade de micropigmentação do mamilo, como tratamento, é complementação da cirurgia plástica, o qual não foi realizado por ter a autora abandonado o tratamento pós-operatório (fls. 150-151).

       No que concerne à alegação da autora de que sua capacidade reprodutiva foi ameaçada, o perito foi peremptório ao afirmar de que isso não é verdade (fls. 153). Por fim, no que tange a acusação de que os réus não atenderam a autora observando a melhor técnica e os cuidados impostos pela ética médica, não existe qualquer prova de veracidade de tais alegações. É evidente que a autora não ficou satisfeita com o tratamento recebido, e isso sem dúvidas é relevante e importante uma vez que cabe ao médico e ao nosocômio confortar seu paciente. No entanto, é necessário provar a infração do médico e do hospital aos seus deveres profissionais. E provar de maneira indubitável, em razão da gravidade das conseqüências de eventual condenação. Tais provas não existem nos autos.

       Isto posto, julgo improcedente o pedido autoral e condeno a autora a arcar com as despesas judiciais e honorários advocatícios, em favor dos réus, de 10% sobre o valor atribuído a causa, cuja exeqüibilidade suspendo nos termos da Lei n. 1.060/50.

       P.R.I.C. Anote-se nos assentamentos cartorários e no distribuidor o correto nome e qualidade da segunda ré.

São Gonçalo, 31 de maio de 2005.



EDUARDO ANTÔNIO KLAUSNER

Juiz de Direito


COMENTÁRIO




Não houve recurso contra a sentença, que transitou em julgado, estando o processo findo e arquivado. O ônus da sucumbência fixado na sentença também não foi executado pelo vencedor.

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