por Eduardo Klausner

terça-feira, 15 de agosto de 2017

SOBRE A DISCIPLINA DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS

Este trabalho foi publicado originalmente como capítulo do livro "Conflitos e Verdade no Direito", portanto é obrigatória a referência abaixo em caso de citação do trabalho em obras ou publicações.
(Referência para citação: KLAUSNER, Eduardo Antônio. Sobre a Disciplina Direito Internacional dos Direitos Humanos. GARRIDO, Rodrigo Gazinoli, PEREIRA, Thiago Rodrigues, ASENSI, Felipe Dutra (organizadores). Conflitos e Verdade no Direito. 2016. Rio: Ed. Multifoco, p. 243-271)

SOBRE A DISCIPLINA DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS
 
EDUARDO ANTÔNIO KLAUSNER*           

 

 

Sumário: 1. Introdução. - 2. O Direito Internacional dos Direitos Humanos como ramo dogmático da Ciência do Direito: 2.1. O conteúdo do Direito Internacional dos Direitos Humanos: 2.2. a Disciplina Direito Internacional dos Direitos Humanos no Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Católica de Petrópolis - 3.  Considerações finais – 4. Referências.

 

1.      Introdução.
O presente artigo visa apresentar brevemente o Direito Internacional dos Direitos Humanos como ramo dogmático e autônomo da Ciência do Direito, seus princípios, estrutura e funcionamento, bem como a importante relação que mantém com as ordens jurídicas nacionais e seus sistemas de proteção aos Direitos Humanos, sem, contudo, ter qualquer pretensão de esgotar o assunto.
Outrossim, o presente trabalho também tem por fim dissertar sobre o Direito Internacional dos Direitos Humanos, na qualidade de disciplina jurídica do Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD) da Universidade Católica de Petrópolis (UCP), assim como destacar a importância do estudo dos temas e problemas pertinentes ao seu objeto para uma formação integral dos discentes voltada para os Direitos Humanos.
A realização do I Seminário Nacional sobre Justiça, Processo e Direitos Humanos, pelos Professores do PPGD da UCP nos dias 8 e 9 do mês de outubro de 2015, com a participação de renomados professores brasileiros e estrangeiros como conferencistas, bem como a massiva presença de professores e pesquisadores de diversas instituições nacionais nos sete Grupos de Trabalho, sendo um desses Grupos de Trabalho dedicado ao Direito Internacional dos Direitos Humanos; somado ao comparecimento do corpo discente da graduação e da pós-graduação às palestras, aos cursos e aos grupos de trabalho - como ouvintes ou participantes -, faz oportuno e conveniente trazer à ribalta a disciplina jurídica dedicada à proteção internacional dos direitos humanos.
Por um lado, o Direito Internacional dos Direitos Humanos, por conta de sua juventude como ramo dogmático do Direito, ainda não é bem conhecido ou compreendido pelos juristas brasileiros que não se dedicam ao Direito Internacional embora sejam comprometidos com os Direitos Humanos. Por outro, professores e pesquisadores de outras áreas do saber e dedicados ao estudo das questões envolvendo Direitos Humanos tendem a passar ao largo das questões jurídicas[1], o que dificulta, por vezes, o diálogo e a ação interdisciplinar em prol de uma política viável de promoção e defesa dos Direitos Humanos.
O presente texto, apesar da sua simplicidade, pretende, ao menos, delinear a disciplina de modo a demonstrar que o estudo do Direito Internacional dos Direitos Humanos é condição sine qua non para quem pretende, de maneira profícua, atuar e pensar sobre a proteção e a promoção do ser humano no que tange aos seus direitos fundamentais.
 
2.       O Direito Internacional dos Direitos Humanos como ramo dogmático da Ciência do Direito.
Muitos estudiosos discutem sobre os fundamentos dos Direitos Humanos; se esses Direitos Humanos têm por origem o Direito Natural, ou se são uma conquista progressiva e histórica, que leva à sua positivação jurídica e, consequentemente, à coercitividade. Alguns recorrem à Antiguidade e aos textos religiosos, a fim de localizar a origem dos Direitos Humanos. Outros, discutem a natureza dos Direitos Humanos e o seu catálogo; ou seja, se esses direitos são prevalentes a outros e quais são esses direitos. Há aqueles que afirmam que todos os direitos são direitos humanos, e, por isso, que a distinção é política ou meramente arbitrária. Há também os que pregam haver limites para se considerar direitos como Direitos Humanos, uma vez que sua vulgarização macularia suas características (ver por todos, RAMOS, 2014, p. 27-143, passim).
Também se discute, na doutrina, a respeito do melhor nomen juris e da eventual distinção entre as expressões: Direitos do Homem, de cunho jusnaturalista; Direitos Fundamentais, nome mais afeito às proteções nacional e constitucional; Direitos Humanos, de viés internacionalista e referente a direitos positivados em tratados internacionais ou em costumes internacionais (vide MAZZUOLI, 2013, p. 852-3).
Não se pretende, neste pequeno trabalho, discutir a questão sobre os fundamentos dos Direitos Humanos, pois, parte-se do pressuposto positivista normativo, uma vez suficiente para fundamentar a existência do Direito Internacional dos Direitos Humanos (nesse sentido, VASAK, 1976, p.343).
Também não há qualquer pretensão de se discutir qual o melhor nome para a disciplina. Utiliza-se o nome Direito Internacional dos Direitos Humanos, uma vez que o mesmo já está consagrado, pelas melhores doutrinas nacional e internacional, como a disciplina jurídica dedicada aos Direitos Humanos no plano internacional, mesmo quando interagindo com o direito interno (cf. se constata, por exemplo, em VASAK, 1976, p.403 e s.; TRINDADE, 2003, vol. I, p. 33 e s.; BUERGENTHAL, 2009, p. 1 e s.).
Hoje, o problema fundamental em relação aos Direitos Humanos é como protegê-los, e como torná-los eficazes e efetivos. A fonte normativa básica é a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, aceita e reconhecida pela maioria dos Estados que compõem a comunidade das nações, a ponto de ser considerada jus cogem (nesse sentido também BOBBIO, 1992a, p. 23-24).
Considerando-se a elaboração dos Direitos Humanos num viés político, histórico e também jurídico, constata-se que a formação contemporânea do que se entende por Direitos Humanos decorre de uma inversão de perspectiva na formação do Estado moderno e na relação política com o povo: não mais uma relação de subordinação entre o Soberano e o Súdito, mas uma relação de direito público constitucional entre o Estado e o Cidadão fundada no contrato social, propiciando uma visão política a partir do indivíduo para a sociedade, e não mais do ponto de vista do soberano para o súdito.
Essa nova relação política acima citada foi se afirmando principalmente na era moderna a partir do pensamento liberal, do direito natural humanista e racional, bem como do desmonte da sociedade hierarquizada e feudalista - pelas guerras de religião e pelas revoluções populares contra a opressão. O marco histórico incontestável é a Revolução Francesa, com a aprovação pela Assembleia Nacional da Declaração dos Direitos do Homem, em 26 de agosto de 1789, após a renúncia dos nobres aos seus privilégios feudais em 04 de agosto de 1789; que, um século e meio depois, serviu de inspiração para a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 (nesse sentido BOBBIO, 1992b, p. 113 e s.).
Assim os Direitos Humanos vão, paulatinamente, afirmando-se historicamente no Ocidente, no seio da relação indivíduo-sociedade-Estado, e conquistando uma proteção para o indivíduo contra abusos do Estado e de seus agentes. Isso caracteriza tais direitos essencialmente como direitos da liberdade “diante de um poder estatal de intervenção, em princípio limitado, mensurável e controlável” (BONAVIDES, 2010, p. 561).
Essa progressiva construção histórica dos Direitos Humanos na relação política e jurídica do cidadão com o Estado se estende, necessariamente, às relações privadas, propiciando uma igualdade formal nas relações jurídicas privadas. O conceito de isonomia jurídica entre os membros da sociedade, posteriormente, sofistica-se e torna-se uma ideia de igualdade material efetiva na sociedade, a qual deverá ser alavancada pelo próprio Estado.
Já no início do século XX, algumas Cartas constitucionais inauguram a positivação de direitos econômicos e sociais como Direitos Humanos, direitos esses denominados de segunda geração - como a Carta Mexicana de 1917, que foi o protótipo dos documentos nacionais tratando-se desses direitos (cf. VASAK, 1976, p. 344), e a Constituição de Weimar (cf. LENZA, Pedro, 2013, p. 1029.).
 Nessa fase, a soberania dos Estados descartava qualquer fundamento para que fosse idealizado um Direito Internacional no qual os seres humanos também fossem sujeitos de direito.
As teorias tradicionais sobre a natureza do Direito Internacional levavam à conclusão de que a maneira como um Estado tratava seus nacionais não era regulada pelo Direito Internacional, porque não afetava os direitos de outros Estados.
O Direito Internacional Público era um direito construído e usado para governar as relações entre Estados (definição essa, expandida após a Primeira Guerra Mundial para incluir como sujeitos da relação jurídica internacional as organizações intergovernamentais recém-criadas), salvo exceções bem pontuais e decorrentes de uma inicial doutrina sobre intervenção humanitária, cultivada por doutrinadores como Hugo Grotius a partir do Século XVII.
Os seres humanos eventualmente beneficiavam-se do Direito Internacional Público, ao gozar da proteção do Estado do qual eram nacionais quando estivessem no estrangeiro, mas não como sujeitos de direito numa relação jurídica de Direito Internacional Público, que se caracteriza como jus imperium.
Muito menos havia qualquer pretensão suficientemente expressiva no âmbito do Direito Internacional Público e de seus estudiosos e operadores, no intuito de intervir em questões atinentes à população de algum Estado, embora o assunto não fosse inteiramente ignorado. A soberania dos Estados sempre limitou qualquer pretensão de intervenção internacional nos assuntos relacionados à população de um Estado, por ser interesse interno e soberano dos Estados.
Exceção à doutrina tradicional era preconizada pela doutrina da intervenção humanitária exposta a partir do século XVII, principalmente por importantes internacionalistas como Hugo Grotius - conforme já dito acima -, e posteriormente reconhecida como juridicamente coercitiva. Por essa doutrina humanitária, era legítima a utilização da força por um ou mais Estados para paralisar maus-tratos de um Estado contra a sua própria população, quando essa conduta fosse tão brutal e em larga escala que causasse escândalo na comunidade das nações, (cf. BUERGENTHAL, 2009, p. 2-6).
Apesar da doutrina da intervenção humanitária ter sido desvirtuada muitas vezes para justificar a invasão e a ocupação ilícitas de países militarmente mais fracos do que outros, ela foi o primeiro limite, em nível internacional, contra os eventuais abusos dos Estados contra o próprio povo. Essa doutrina continua atual e justifica uma série de ações da Organização das Nações Unidas (ONU), inclusive, a criação de tribunais penais internacionais para punir os responsáveis por crimes contra a humanidade, genocídio e crimes de guerra, como os tribunais de Ruanda e da ex-Iugoslávia.
Outros tratados e doutrinas de natureza humanitária foram também se desenvolvendo no plano internacional, contando, especialmente, com a cessão de parcela da soberania por parte dos Estados conveniados, no intuito de proteger seres humanos, como, por exemplo, os tratados levados a termo no início do século XIX para banir a escravidão ou para proteger minorias cristãs no Império Otomano. Cite-se, também, o sistema de mandatos e o sistema de proteção de minorias formado pela Liga das Nações; as regras da Organização Internacional do Trabalho, fundada na mesma época da Liga das Nações (após a Primeira Guerra Mundial em 1919 como parte do Pacto de Versalhes); e o Direito Internacional Humanitário, ou Direito da Guerra, que busca salvaguardar as pessoas que não participam ou que deixaram de participar das hostilidades, e que restringe os meios de combate, antiquíssimo, e que em sua versão moderna se estabeleceu através de diversas convenções a partir de 1864 (nesse sentido BUERGUENTHAL, 2009, p. 3-24, passim).
Toda essa regulação internacional, acima citada, em favor dos seres humanos, sem dúvidas, contribuiu para o desenvolvimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos. No entanto, não se confunde com o Direito Internacional dos Direitos Humanos, pois não reconhece o ser humano como indivíduo singular e sujeito de direitos no Direito Internacional, capaz de pleiteá-los na arena internacional em pé de igualdade com os Estados e, principalmente, capaz de demandar contra o seu próprio Estado em tribunais internacionais.
A necessidade da proteção geral, sistemática e internacional da pessoa humana tornou-se uma evidência iniludível e também uma exigência, principalmente em razão da violação massiva e abusiva da dignidade e da integridade de seres humanos, justificada pela discriminação racial, a qual culminou com o genocídio desencadeado pelos nazistas alemães, valendo-se do Estado alemão contra o povo judeu, inclusive contra judeus alemães, durante a Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945) (cf. BUERGENTHAL, 2009, p. 29-30).
A Ciência do Direito - o Direito nacional alemão - foi incapaz de proteger as vítimas do Estado Nazista, e, pelo contrário, foi manipulada para chancelar decisões oficiais, inclusive judiciais, atentando contra os mais basilares direitos da pessoa humana (considerados inerentes ao ser humano numa perspectiva jus naturalista), como a vida, a integridade física e a propriedade.
Gustav Radbruch, ao final da Segunda Guerra Mundial, em 1945, ao reassumir a sua cátedra em Heidelberg, deixou claro todo o mal que um positivismo jurídico de matriz autoritária causou[2], e, em famoso opúsculo dirigido aos alunos da Faculdade de Direito da Universidade de Heildelberg, aconselha que nunca mais seja afastado do conceito de validade das normas um valor de Justiça composto por um núcleo duro de direitos fundamentais consagrado nas declarações dos direitos dos homens e dos cidadãos, cujo reconhecimento já era universal (ver RADBRUCH, 1961).
O Direito Internacional dos Direitos Humanos reconhece cada indivíduo, cada pessoa humana, como sujeito de direitos, com direitos universais garantidos internacionalmente pela comunidade das nações, independentemente da nacionalidade ou de qualquer outro requisito que não seja a sua própria humanidade (inclusive em tempos de paz e contra o seu próprio Estado). Trata-se, portanto, de um direito de proteção do ser humano em toda a sua dignidade, - direito esse dotado de corpus juris e princípios próprios e específicos a nível global e regional -, e não um direito interestatal, no qual os sujeitos são os Estados e as Organizações Internacionais, como o Direito Internacional Público e geral; o que necessariamente acarreta uma autonomia e especificidade própria que o tipifica como novo ramo dogmático do Direito (nesse sentido TRINDADE, vol. I, 2003, p. 25-38).
O Direito Internacional dos Direitos Humanos, como ramo dogmático do Direito, posiciona-se de modo objetivo e positivista, já que encontra o seu marco fundacional na Declaração Universal de Direitos Humanos, datada de 1948, reconhecida hodiernamente como jus cogem, promulgada por consequência da Carta das Nações Unidas, a qual estipulou como um dos objetivos caros às Nações Unidas a proteção aos Direitos Humanos (vide arts. 55 e 56 da citada Carta).
Consequentemente, Direitos Humanos Internacionais são os que estão positivados na Declaração Universal dos Direitos Humanos, bem como os que estão reconhecidos e positivados em tratados internacionais e pelas resoluções dos órgãos das Nações Unidas - como a Assembleia Geral, o Conselho Econômico e Social e, especialmente, a Comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (nesse sentido, PIOVESAN, 2006, p. 210) -, e pelas fontes de Direito Internacional tradicionalmente reconhecidas e elencadas no artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça; bem como o positivado pelas organizações regionais e órgãos de proteção aos direitos humanos em nível regional.
Afinal, são as normas válidas e em vigor que possuem caráter coercitivo e universal, especialmente no âmbito do Direito Internacional, no qual as principais pessoas envolvidas nas relações internacionais são Estados soberanos que congregam a diversidade cultural de suas sociedades.
Após mais de sessenta anos de evolução, o Direito Internacional dos Direitos Humanos, além da Carta das Nações Unidas e da Declaração Universal dos Direitos Humanos, tem hoje uma série de tratados internacionais, universais e regionais, visando à proteção e à efetivação dos Direitos Humanos, constituindo um significativo corpo de direito material.
Outrossim, uma série de Organismos Internacionais foram criados especificamente para a proteção internacional da pessoa humana, organizados universalmente e regionalmente de modo a dar efetividade e eficácia aos direitos materiais; de modo que também formou-se um conjunto de tratados constitutivos, além de um direito administrativo internacional próprio e um direito processual internacional específico para a proteção internacional dos Direitos Humanos.
Mais uma característica do Direito Internacional dos Direitos Humanos é a sua relação com os órgãos internos dos Estados que são requisitados a aplicar as normas internacionais. Nesse aspecto, a interação entre direito internacional e direito nacional é absoluta, passando os órgãos dos Estados a serem parte direta do mecanismo de proteção internacional da pessoa humana.
 A adoção de medidas nacionais eficazes pelos órgãos nacionais competentes para implementação ou proteção dos Direitos Humanos é parte da própria proteção internacional dos Direitos Humanos. Isso leva a uma abordagem não mais compartimentada dos Direitos Humanos, mas integrada e harmônica entre o direito nacional e o internacional. Supera-se, assim, dogmas do passado quanto à efetividade de determinadas categorias dos Direitos Humanos e à sua justiciabilidade, bem como se reforça a característica da indivisibilidade dos Direitos Humanos e o atributo de ser erga omnes no âmbito público ou privado (nesse sentido,  TRINDADE, vol. I, 2003, p. 516 e s., passim.)
O Direito Internacional dos Direitos Humanos foi capaz de repercutir com tanta intensidade nas ordens jurídicas nacionais, que diversas Constituições foram diretamente influenciadas por suas normas. Cite-se, a título de exemplo, a Constituição brasileira, “que, no campo dos direitos fundamentais, acolheu a maior parte dos direitos previstos nos principais tratados e declarações de direitos humanos. [...] E tais influências, como se verá abaixo, continuam a acontecer na seara constitucional mesmo após a elaboração da Constituição, no contexto de sua interpretação e aplicação. Trata-se de uma tendência global de diálogos de fontes e de cortes, que também se manifesta no Brasil” (cf. SARMENTO, 2015, p. 137-138).
Portanto, pode-se afirmar com segurança que o Direito Internacional dos Direitos Humanos constitui-se como ramo dogmático autônomo da Ciência Jurídica contemporânea.
 
2.1. O conteúdo do Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Como bem coloca Karel Vasak, (op.cit., p.343), ninguém contesta ser o ponto de partida do Direito Internacional dos Direitos Humanos a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, no sentido de primeiro positivar juridicamente os direitos humanos no plano internacional.
No entanto, muitos autores consideram a Carta de São Francisco, documento constitutivo e fundacional da Organização das Nações Unidas, como o primeiro documento de Direito Internacional dos Direitos Humanos (nesse sentido, v.g., BITTAR e ALMEIDA, 2010, p. 628, e CARPIZO, 2012, p. 806), pois foi a partir da Carta da ONU que o compromisso universal, a proteção dos Direitos Humanos, pôde ser elaborado.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi gerada a partir da constituição da ONU, cuja Carta assegura como objetivo das Nações Unidas a proteção dos direitos do homem especialmente em seus artigos 55 e 56, sem, no entanto, defini-los, como já anteriormente exposto.
A Declaração Universal, por sua vez, foi adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas sob a forma de resolução, sem efeito vinculante, sem força legal, mas como declaração de princípios (nesse sentido CASSIN, 1951, p. 288 e 289, inclusive, citando o discurso de Mme. Roosevelt na tribuna da Assembleia Geral da ONU cf. em nota de rodapé de número 2).
A Declaração Universal dos Direitos Humanos pode ser comparada ao vasto pórtico de um templo, como expõe René Cassin, cujo preambulo afirma a unidade da família humana e a dignidade e as igualdades dos seres humanos detentores de direitos inalienáveis, sustentado por quatro colunas de igual importância: os direitos da liberdade e da personalidade (arts. 3º. a 11º.); os direitos do homem na sociedade (arts. 12 a 17); os direitos de liberdade religiosa, da liberdade pública e dos direitos políticos fundamentais (art. 18 a 22); os direitos econômicos, sociais e culturais (CASSIN, 1951, p. 277-278).
Nascida como mera declaração de cunho político, a Declaração Universal dos Direitos Humanos tomou força jurídica vinculante pelo reconhecimento universal da obrigatoriedade dos valores e direitos nela reconhecidos. Três são os argumentos centrais dessa tese: a incorporação dos valores e dos direitos elencados na Declaração pelas Constituições dos Estados; as referências de diversas Resoluções da ONU à obrigação de todos os Estados de observar os direitos dispostos na Declaração; e o reconhecimento pelos órgãos judiciários nacionais e internacionais da Declaração como fonte de direito (segundo PIOVESAN, 2006, p. 137-139, citando vários autores).
No entanto, merece ser frisado que na Conferência Internacional sobre Direitos Humanos de Teerã, 1968, os Estados partícipes expressamente assentaram na ata final o reconhecimento à universalidade dos direitos declarados e à sua obrigatoriedade para a comunidade internacional (cf. CARPIZO, 2012, p. 808).
Posteriormente, também sob os auspícios das Nações Unidas, foram produzidos dois Pactos no intuito de vincular juridicamente os Estados, bem como dar efetividade aos direitos declarados na Declaração Universal: o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ambos de 1966. Os dois Pactos, juntos com a Declaração Universal, passaram a ser reconhecidos como verdadeira Carta Internacional dos Direitos Humanos.
Outros tratados de natureza cosmopolita foram recepcionados e integrados a essa novel ordem jurídica internacional. Por sua vez, tratados para proteção dos seres humanos em situações específicas de vulnerabilidade foram firmados, como, por exemplo, a Convenção contra o Genocídio, de 1948; a Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados, de 1951; a Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial, de 1965; a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979; a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, de 1984; a Convenção sobre os Direitos das Crianças, de 1989; a Convenção sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migratórios e seus Familiares, de 1990, entre muitas outras.
Para o Direito Internacional dos Direitos Humanos, é indiferente qualquer divisão dogmática entre os direitos que abrange, como a existente na família do Direito Romano-Germânico entre Direito Público ou Privado. As normas e os princípios de Direito Internacional dos Direitos Humanos destinam-se a proteger e promover a dignidade do ser humano em todas as suas relações jurídicas, sejam públicas, sejam privadas.
Constata-se, portanto, que o conteúdo do Direito Internacional dos Direitos Humanos cuida de extensos e variados temas de direito material: direitos civis e políticos; direitos econômicos, sociais e culturais; e os chamados novos direitos humanos, direitos da solidariedade, v.g. direito ao meio ambiente sadio, direito à paz, etc.; normatizados a partir da Declaração Universal de 1948 por tratados, alguns já citados mais acima, e suas interpretações pelos diversos órgãos componentes do sistema internacional e do sistema jurídico nacional dos Estados-Partes.
Além disso, verifica-se que o Direito Internacional dos Direitos Humanos se funda sobre princípios próprios e bem diferentes do Direito Internacional Público. Enquanto o Direito Internacional Público valoriza a igualdade entre os Estados e a sua soberania, e se caracteriza como um direito de coordenação, o Direito Internacional dos Direitos Humanos é eminentemente protetivo, voltado à proteção e à promoção do ser humano, vulnerável diante do Estado. A dignidade do ser humano não é objeto de proteção apenas quando violada de modo positivo, todavia, como princípio, determina direitos e obrigações a serem observados pelos Estados. As chamadas categorias de Direitos Humanos são consequências da proteção da dignidade do ser humano nas diversas dimensões e relações da vida.
Concorrentemente, órgãos internacionais foram sendo criados como estrutura funcional, executiva e/ou jurisdicional, para supervisionar o cumprimento dos tratados de Direitos Humanos firmados pelas partes, investigar eventuais violações, julgar violações apuradas e adotar medidas aptas a indenizar e restaurar o direito violado.
Paralelamente à regulação de direito substantivo decorrente dos tratados internacionais, cuja implementação fica a cargo exclusivo dos Estados-Partes numa ordem política e jurídica internacional tradicional, foram surgindo órgãos na estrutura da administração direta das Nações Unidas, de vigilância e supervisão, para a proteção dos Direitos Humanos em geral.
Esse movimento de cosmopolitização da proteção dos Direitos Humanos repercutiu nas organizações regionais existentes, como a Organização dos Estados Americanos, e nas que surgem após 1945, mesmo que de cunho inicialmente econômico, como a atual União Europeia, para que criem seus próprios tratados regionais destinados à proteção internacional do ser humano.
Ainda, a nível regional, deflagra-se um fértil processo de criação de instituições internacionais para a proteção dos direitos humanos em geral, como, por exemplo, a Corte Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Europeia de Direitos Humanos. Esses órgãos jurisdicionais internacionais são competentes para investigar, apurar, processar e julgar violações aos Direitos Humanos, - por ações ou por omissão do Estado a quem competia a proteção primária -, bem como para fixar indenizações e reparações ao direito violado em prol das vítimas e de seus descendentes; e aptos a impor ao Estado infrator medidas corretivas na sua ordem jurídica nacional e na sua estrutura institucional, de modo a evitar novas violações sob a mesma motivação.
 Consequentemente, ao conteúdo de direito material da disciplina objeto de estudo e decorrente dos tratados destinados à proteção internacional dos direitos humanos foi acrescido um vasto direito adjetivo e institucional. Já há quem sugira ser necessária uma teoria geral para o processo internacional de direitos humanos (cf. FERREIRA e FREIRA, 2011).
Instrumentos constitutivos de organismos internacionais, universais ou regionais, bem como os processos e procedimentos para dar efetividade e eficácia em âmbito internacional aos direitos protegidos - de modo a que no âmbito nacional os direitos sejam respeitados, protegidos e/ou efetivados de modo coercitivo pelos envolvidos e pelo próprio Estado-Parte -, somados às decisões jurisdicionais e consultivas dos organismos internacionais sobre os casos levados à apreciação, formam uma variada e vasta legislação internacional e um cabedal de jurisprudência sobre o qual o estudante e pesquisador de Direito Internacional dos Direitos Humanos necessariamente deve se debruçar (sobre o funcionamento dos órgãos internacionais de proteção aos direitos humanos ver ALSTON e GOODMAN, 2013, p. 685 e s.).
Frise-se que, primariamente, compete às instâncias nacionais dos Estados-Partes dos tratados darem efetividade aos mesmos, como já exposto em outro momento. Assim, os órgãos nacionais, de certo modo, também fazem parte do sistema internacional de proteção aos Direitos Humanos. Isso não desmerece o Sistema de Proteção Internacional dos Direitos Humanos ou diminui a relevância da internacionalização dos Direitos Humanos, ocorrida após a Segunda Guerra Mundial, como pensam alguns doutrinadores (vide DMOULUS e MARTINS, 2015, p.29.).
O Direito Internacional dos Direitos Humanos e os organismos internacionais dedicados à proteção do ser humano se justificam justamente pela capacidade e competência de conformar a ação do Estado e obrigá-lo a respeitar os Direitos Humanos. Como bem coloca Flavia Piovesan, “ao enfrentar a publicidade das violações de direitos humanos, bem como as pressões internacionais, o Estado é praticamente ‘compelido’ a apresentar justificativas a respeito de sua prática. A ação internacional e as pressões internacionais podem, assim, contribuir para transformar uma prática governamental específica, no que se refere aos direitos humanos, conferindo suporte ou estímulo para reformas internas.” (op.cit. p. 313).
No Brasil, por exemplo, que tem vários casos examinados e julgados na Comissão Interamericana e na Corte Interamericana de Direitos Humanos, é notória a influência que o Caso Maria da Penha Maia Fernandes teve para alterar a legislação brasileira e conformar o Estado brasileiro a criar e aparelhar órgãos do Poder Executivo e do Poder Judiciário para atuar na prevenção e na punição dos crimes de violência doméstica e contra a mulher.
Por outro lado, se o Estado é o principal garantidor dos Direitos Humanos ou Fundamentais, ele também tem sido o maior violador de Direitos e Garantias Fundamentais dos seres humanos sob sua jurisdição, mesmo após o Holocausto, o fim da Segunda Guerra e a criação de um Sistema Internacional de Proteção dos Direitos Humanos.
Genocídios e graves crimes contra a humanidade foram perpetrados por Estados contra seus nacionais, ou por terceiros com a complacência do Estado, como os massacres ocorridos na antiga Iugoslávia e Ruanda, entre tantos outros; e as instâncias internacionais tiveram que agir diretamente, inclusive instalando tribunais internacionais para julgamento dos autores e acusados pelas violações (o Tribunal para Crimes de Guerra praticados na Iugoslávia foi estabelecido pela Resolução n. 827 de 1993, e o Tribunal Penal Internacional para Ruanda foi estabelecido pela Resolução n. 955 de 1994, pelo Conselho de Segurança da ONU).
Hoje o Tribunal Penal Internacional Permanente é uma realidade que conta com a adesão de 123 Estados-partes e visa o fim da impunidade para crimes de genocídio e contra a humanidade. O Brasil ratificou o tratado de criação do Tribunal em 20 de junho de 2002 e pelo Decreto 4.388 de 25 de setembro de 2002 promulgou o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. Posteriormente, pela Emenda Constitucional n. 45 de 2004, adicionou à Constituição Federal um parágrafo 4º ao artigo 5º, no qual declara a submissão do Brasil à jurisdição do Tribunal Penal Internacional.
O fato dos organismos internacionais agirem quando os órgãos nacionais são inaptos ou omissos para proporcionar a devida proteção ou efetividade a determinado direito, ou seja, ter uma ação complementar ou subsidiária; o fato de ser um requisito de admissibilidade para o exercício do direito de ação do indivíduo ao peticionar a um organismo internacional de proteção aos Direitos Humanos ter previamente esgotado às instâncias nacionais de proteção, (sobre esse assunto ver TRINDADE, v. II, 1999, p. 82-122, passim); não diminuem a relevância do Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Na verdade, a ação dos organismos nacionais no cumprimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos faz com que, necessariamente, o estudioso da matéria leve em consideração, também, as decisões nacionais pertinentes à temática, aumentando, assim, conteúdo da disciplina ora em comento.
Por outro lado, o Direito Internacional dos Direitos Humanos vale-se de princípios norteadores próprios, como já afirmado mais acima. Entre esses princípios destaque-se o princípio da subsidiariedade, fundamental a fim de se respeitar a soberania dos Estados; mas também importantíssimo para assegurar o rápido e efetivo respeito aos Direitos Humanos, (nesse sentido, TRINDADE, v. 1, p. 516 e s, passim; sobre o princípio da subsidiariedade ver, entre outros, CAROZZA, 2003).
A responsabilidade de proteger os seres humanos é compartilhada entre os Estados e a Comunidade Internacional como um todo. Contemporaneamente se discute sobre a possibilidade de, sob os auspícios das Nações Unidas ou de Organizações Regionais, promover-se intervenção militar de natureza humanitária sempre que o Estado não for apto, ou não quiser dar conta de sua responsabilidade na proteção dos seres humanos sem que tal conduta represente violação ilícita à soberania nacional, (sobre o tema ver, entre outros: STAHN, 2007, e JÁRDON, 2012). Agrega-se, portanto, ao conteúdo da matéria, novas e difíceis questões antes da seara absoluta do Direito Internacional Público geral.
Como visto neste tópico, o conteúdo do Direito Internacional dos Direitos Humanos é vasto ao cobrir um elenco grande de Direitos Humanos positivados e regulados por tratados a partir da Declaração Universal, bastante variado, e que se estende para além do direito material, englobando um direito processual e um direito de cunho administrativo dedicado a estrutura dos organismos institucionais, alcançando e influenciando, também, temas antes exclusivos do Direito Internacional Público clássico e do Direito Internacional Econômico.
Consequentemente, uma disciplina jurídica de tamanha grandeza precisa ser bem organizada em um currículo pedagógico, de modo a permitir que o aluno conheça os seus princípios, seus principais temas e instrumentos internacionais na carga horária planejada.
 
2.2. A disciplina Direito Internacional dos Direitos Humanos no Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Católica de Petrópolis
O Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Direito da Universidade Católica de Petrópolis é consequência do Projeto Pedagógico Institucional, que tem entre os princípios norteadores a dedicação temática à Justiça e os Direitos Humanos, revestindo-se, portanto, “de capital importância para o Centro de Ciências Jurídicas, pois expressa sua particular e fundamental missão na Universidade”(2006).
 Consequentemente, a partir de 2009 desenvolveu-se o projeto institucional da Universidade Católica de Petrópolis criando-se o citado Programa de Pós-Graduação stricto sensu/Mestrado em Direito, com área de concentração única em “Justiça, Processo e Direitos Humanos”, “com o papel precípuo de produzir estudos e pesquisas voltadas para a geração de um comprometimento com a concretização dos direitos humanos.”
Como “diferencial proposto” inclui preponderantemente os temas da Justiça e dos Direitos Humanos na abordagem do Direito Internacional e do Direito Constitucional de modo a favorecer a formação jurídica dos estudantes “na ótica de uma cosmovisão humanista de defesa da justiça e dos direitos humanos” (UCP, 2009).
Consequentemente, a disciplina Direito Internacional dos Direitos Humanos é importantíssima na estrutura curricular do Curso de Mestrado em Direito, para que seja atingido o seu desiderato pedagógico e institucional.
 A Área de Concentração é o núcleo temático com três disciplinas obrigatórias para os estudantes, e abriga duas Linhas de Pesquisa, uma das quais deverá ser escolhida pelo aluno e nela cursar necessariamente cinco disciplinas vinculada à linha de pesquisa eleita. O aluno também poderá cursar uma disciplina da linha de pesquisa não eleita.
As acima citadas Linhas de Pesquisa são: (1) Fundamentos da Justiça e dos Direitos Humanos e (2) Processo e Efetivação da Justiça e dos Direitos Humanos. A disciplina Direito Internacional dos Direitos Humanos está inserida na Linha de Pesquisa 2.
O conteúdo da disciplina em comento não tem a pretensão de estudar todo o Direito Internacional dos Direitos Humanos, considerando a amplitude temática da matéria como já demonstrado em tópico mais acima. Os professores desse ramo do Direito há muito se debruçam sobre o conteúdo da disciplina, de modo a selecionar os temas que devem necessariamente ser ministrados aos alunos e os que podem ser olvidados ou apenas referidos, (vide, por exemplo, o panel realizado pela American Society of International Law em 1971, com a participação de vários mestres da disciplina, in RUSSO, VAN DYKE, LILLICH, 1971).
 A ementa da disciplina em questão apresentada ao PPGD da UCP e proposta aos discentes visa abraçar o conteúdo a ser ministrado durante o curso de um semestre letivo, no qual se busca proporcionar ao estudante não só uma visão geral da matéria, mas sólidos conhecimentos sobre o fundamental da disciplina. O objetivo pedagógico é fornecer a base necessária para o aprofundamento dos estudos e pesquisas do mestrando. A ementa está assim redigida:
“Disciplina: Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH).
Ementa: Noções de Direito Internacional Público e a autonomia do DIDH: aspectos históricos e políticos, formação, fase legislativa e fase de implementação. Características dos Direitos Humanos. Os instrumentos normativos internacionais fundamentais para a disciplina e suas especificidades. As relações entre os DH, a Democracia e o Desenvolvimento. Convergências entre os DH, o Direito Humanitário e o Direito dos Refugiados. A questão do Drittwirkung. A proteção dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais: estado atual e perspectivas. A interação entre o Direito Internacional e o Direito Interno na proteção dos Direitos Humanos: a incorporação da normativa internacional de proteção dos DH ao Direito interno dos Estados, sua posição no ordenamento jurídico interno e eventual conflito com outras fontes de Direito. A obrigação dos Estados de dar eficácia a proteção dos DH por seus órgãos internos. A hermenêutica própria dos DH, sua aplicação e a primazia da norma mais favorável às vítimas. O esgotamento dos recursos internos e a intervenção de organismos internacionais de proteção aos DH. A execução de sentenças dos Tribunais Internacionais de DH e as reparações às vítimas. O sistema global e os sistemas regionais de proteção internacional aos DH: o sistema europeu, o sistema interamericano, o sistema africano, suas características, órgãos institucionais e jurisdicionais, procedimentos recursais, bem como a construção jurisprudencial em matéria consultiva, protetiva e contenciosa, e sua influência no desenvolvimento da defesa dos DH. Estudos de casos relevantes da Corte Interamericana de DH e da Corte Europeia de DH. O ser humano como Sujeito do DIDH e com capacidade jurídica postulatória autônoma. A universalidade dos DH e os particularismos culturais em geral.”
Para o aluno que deseja aprofundar os seus estudos no semestre seguinte em temas específicos do Direito Internacional dos Direitos Humanos, outra disciplina é oferecida para cursar como optativa da Linha de Pesquisa 2, disciplina essa denominada Temas Emergentes dos Direitos Humanos. A ementa da disciplina citada é redigida de modo amplo, no intuito de abarcar exemplificativamente os mais diversos temas de interesse dos Direitos Humanos no plano internacional, o que é esclarecido ao aluno no primeiro encontro.
Após uma apresentação dos Direitos Humanos no mundo contemporâneo, especialmente tendo por referência a globalização, o professor com os alunos delimita os temas que a classe pretende aprofundar em seus estudos no semestre. Esse método faz com que a cada semestre o curso possa abordar temas diferentes, o que dá um caráter sempre novo e atualizado a disciplina, estimulando o corpo discente a cursá-la e ao professor pesquisador a oferecê-la. Essa disciplina tem a seguinte ementa:
“Disciplina: Temas Emergentes dos Direitos Humanos (TEDH).
Delimitação conceitual dos direitos humanos e dos direitos fundamentais. As dimensões dos direitos humanos e etapas da positivação na esfera internacional e constitucional. Grandes temas na proteção internacional dos direitos humanos: o biodireito, a vida, a saúde e a morte; democracia e paz; estrangeiros, asilados e refugiados; tráfico de seres humanos; mulher; criança; discriminação racial; tolerância cultural e religiosa. A globalização e os direitos humanos: universalismo, relativismo e regionalismo. A globalização econômica e o impacto da ordem econômica internacional e nacional na concretização dos direitos humanos e fundamentais. As organizações econômicas internacionais, as empresas transnacionais, os blocos políticos e econômicos regionais, a integração econômica e o respeito aos direitos humanos. Direito internacional econômico-comercial e direito dos consumidores: um diálogo necessário. Direito internacional dos direitos humanos, direito internacional econômico, direito internacional do comércio, direito comercial internacional e direito internacional privado na progressiva construção de um direito cosmopolita. Direito ao mínimo existencial e direito ao desenvolvimento. Direitos humanos e a segurança pública no ambiente nacional e internacional. O meio ambiente como tema da globalidade na proteção dos direitos humanos: a questão na ordem econômica e comercial; o problema do acesso à água e a distribuição de alimentos, bem como a repercussão das questões ambientais na preservação dos direitos humanos de primeira geração.”
As duas disciplinas são oferecidas regularmente, uma em cada semestre do ano letivo. Direito Internacional dos Direitos Humanos é oferecida no primeiro semestre e Temas Emergentes dos Direitos Humanos no segundo semestre.
A bibliografia de ambas as disciplinas, selecionada e organizada previamente, é bem ampla e atualizada, no entanto, conforme se desenvolvem os trabalhos no semestre, outros artigos e livros são sugeridos como bibliografia complementar.
 
3.      Considerações finais
 Como visto, o Direito Internacional dos Direitos Humanos alçou autonomia dogmática na Ciência do Direito desdobrando-se do Direito Internacional Público. No entanto, ainda mantém relação importante com o Direito Internacional Público, pois ainda se vale de vários dos seus princípios e regras, bem como dos órgãos internacionais constituídos tradicionalmente.     
Outrossim, a singularidade do Direito Internacional dos Direitos Humanos constituiu uma estrutura principiológica que necessariamente prepondera na relação com o Direito Internacional Público, e aproximou-o de maneira importante do Direito Constitucional, em razão de uma interação necessária decorrente do papel fundamental que a estrutura constitucional do Estado representa para a eficiência e eficácia de suas normas.
Assim, o Direito Internacional dos Direitos Humanos constitui-se em um ramo do Direito que tem por natureza ser cosmopolita, instaurar a dignidade de todo o ser humano e o alçar a posição de sujeito de direitos no âmbito internacional a ser necessariamente e universalmente protegido.
 Logo, o Direito Internacional dos Direitos Humanos como disciplina torna-se matéria imprescindível de ser lecionada nos Cursos de Graduação e Pós-Graduação com eixo temático e área de concentração em Direitos Humanos ou Fundamentais.
 
4. Referências
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BITTAR, Eduardo C. B. e ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso de Filosofia do Direito. 8ª. Ed. 2010. São Paulo: Atlas.
BOBBIO, Norberto. Sobre os fundamentos dos Direitos do Homem. A Era dos Direitos.1992. Tradução de Carlos Nelson Coutinho do original L’età dei Diriti, 1990, Torino: Giulio Einaudi Editore. Rio: Campus, p. 15-24.
_________________. A herança da grande revolução. A Era dos Direitos______________________________________________________p. 113-130.
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DIMOULIS, Dimitri e MARTINS, Leonardo. Teoria Geral dos Direitos Fundamentais. 5ª. Ed. S.Paulo: Atlas.
FERREIRA, Rafael Fonseca, e FREIRA, Simone Grohs. Direito Processual Internacional dos Direitos Humanos: do que estamos falando? JURIS, Rio Grande, 16: 49-72, 2011.
JÁRDON, Luis. The Myth, the truth, and wath Security Council Resolution 1973 changed: the use of force for the protection of Human Rights. Anuario Mexicano de Derecho Internacional, vol. XII, 2012, D.F.: UNAM-IIJ, p. 597-629.
LENZA, Pedro, Direito Constitucional Esquematizado. 17ª. Ed. 2013. S.Paulo: Saraiva.
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 2013. 7ª. Ed. S.Paulo: RT.
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RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. 2014. S. Paulo: Saraiva.
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RUSSO, A. Luini; VAN DYKE, Vernon e LILLICH, Richard B. The developing of a Human Rights curriculum. The American Journal of International Law, Vol. 65, n. 4, Strategies for World Order, September 1971, American Society of International Law, p. 250-260, in http://www.jstor.org/stable/25660409, acesso em 28 de outubro de 2015.
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STAHN, Carsten, Responsability to protect: political rhetoric or emerging legal norm? The American Journal of International Law, Vol. 101, n. 1, (jan. 2007), publisher: American Society of International Law, p. 99-120, in < http://www.jstor.org/stable/4149826>, acesso em 24 de abril de 2015.
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VASAK, Karel. Le Droit International des Droits de L’Homme, Recuil des Cours de l’Academie des Droit International de la Haye, vol. 140 (1974). 1976. Leiden: Brill/Nijhoff.
 


* Bacharel em Direito, Mestre e Doutor em Direito Internacional e da Integração Econômica pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ; Professor Permanente de Direito Internacional e Direitos Humanos do Programa de Pós-Graduação – Mestrado em Direito (Área de Concentração: Justiça, Processo e Direitos Humanos) da Universidade Católica de Petrópolis – UCP; Juiz de Direito do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro e Professor da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro – EMERJ.
[1] Os Direitos Humanos são objeto de estudo interdisciplinar por sua própria natureza, especialmente por Filósofos, Antropólogos, Sociólogos, Cientistas Políticos, Pedagogos, Assistentes Sociais e Economistas.
[2] O positivismo a que se refere Radbruch não é o positivismo normativo pensado como Teoria do Direito, especialmente por Hans Kelsen, mas sim uma postura política dos juristas e especialmente dos juízes alemães na República de Weimar, herdada dos tempos do Império: nacionalista, conservadora e autoritária, que não reconhecia no Parlamento autoridade suficiente e adequada para promulgar leis que efetivamente alterassem o “status quo”. Esses juristas aderiram ao Estado nazista e o serviram sem qualquer oposição. Frise-se que o Estado nazista afastou, a partir de 7 de abril de 1933, todos os servidores indesejados do seu legal staff, (juízes social-democratas, professores, advogados, etc., além de judeus), e construiu um sistema apto a controlar o Judiciário e evitar decisões que não se adequassem a filosofia nazista, o que incluía o treinamento e o recrutamento de juristas. A teoria de Hans Kelsen ainda não tinha real repercussão na Filosofia e na Teoria do Direito ou na formação dos juristas durante a República de Weimar e após, durante o Estado nazista. Sobre o tema ver ROTTLEUTHNER,  2011, p. 100-114, passim. 

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

44o. CURSO DE DIREITO INTERNACIONAL DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS

De: Department of International Law (OAS) <DIL=press.oas.org@mail61.atl91.mcsv.net> em nome de Department of International Law (OAS) <DIL@press.oas.org>
Enviado: quarta-feira, 2 de agosto de 2017 11:41
Para: Juiz Eduardo Antônio Klausner
Assunto: Course on International Law begins in Rio

 
OAS at Work cap
AUGUST 2017
OAS at Work
 
EDITION 13
Department of International Law
Course on International Law begins in Rio
COURSE ON INTERNATIONAL LAW BEGINS IN RIO
On July 31st the 44th Course on International Law was inaugurated in Rio de Janeiro, Brazil, an annual academic activity that is organized by the Inter-American Juridical Committee and the Department of International Law (Secretariat for Legal Affairs) of the OAS. At the opening ceremony, the 42 students who are participating this year were welcomed by the Chairman of the Inter-American Juridical Committee (CJI), Dr. Hernán Salinas; Ambassador João Clemente Baena Soares, member of the Committee and former Secretary General of the OAS; and the Director of the Department of International Law, Dr. Dante Negro. The event was also attended by diplomatic and consular authorities of the Member States as well as by Brazilian professors and academics.

During the three week course, participants will receive instruction on various topics in the field of international law, both public and private, as well as new legal developments in the inter-American system. Classes will be taught by a select group of professors from different countries from within the region.

The Course on International Law is one of the activities that comprise the Inter-American Program for the Development of International Law, adopted by the OAS General Assembly in 1997 and updated in 2011, with the purpose of promoting and disseminating international law, the Inter-American legal system and the Organization's legal agenda.

For further information on this matter, please contact the Department of International Law of the Secretariat for Legal Affairs of the OAS +1 202 370-0741.

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Em pé ao fundo e a esquerda: Dr. Dante Negro, Diretor do Departamento de Direito Internacional; Dr. Hernán Salinas, Presidente do Comitê Jurídico Interamericano e o Embaixador João Clemente Baena Soares, membro do Comitê Jurídico Interamericano. Em pé, em plano posterior, alunos, professores e funcionários da OEA. Sentados, autoridades e professores convidados (o editor do blog Juiz de Direito e Professor da UCP Dr. Eduardo A. Klausner é o quarto convidado sentado da direita para a esquerda).