por Eduardo Klausner

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

ATUALIZAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR: SUGESTÃO PARA UMA NOVA REDAÇÃO PARA O ARTIGO 101

No dia 19 de agosto de 2011 a Comissão de Juristas para atualização do Código de Defesa do Consumidor reuniu-se em audiência pública no Instituto dos Advogados Brasileiros. Infelizmente não pude comparecer mas, por sugestão da Professora Dra. Claudia Lima Marques, apresentei minha sugestão para uma nova redação do artigo 101 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor por carta cujo texto transcrevo abaixo.

Frise-se que uma das grandes preocupações que me afligem com as mudanças que possam ser implementadas ao CDC consiste em questões ligadas ao acesso à Justiça. Existe uma grande pressão estrangeira para que permitamos a arbitragem e as cláusulas contratuais com foro de eleição, o que poderá trazer grandes prejuízos a proteção do consumidor.

A arbitragem mantida e fomentada pelo fornecedor, nos Estados Unidos da América, por exemplo, normalmente não assegura os direitos dos consumidores, como provam recentes estudos, e a cláusula de foro de eleição pode inviabilizar completamente o efetivo exercício do direito do consumidor de levar sua demanda ao Judiciário ou defender-se em ações propostas pelo fornecedor.

O alento é que a Comissão de Juristas também compartilha todas estas preocupações, como revelou-me a Prof. Claudia Lima Marques, jurista notoriamente avessa a adoção da arbitragem para a solução dos conflitos de consumo.

Os vídeos da audiência estão disponíveis no sítio do Instituto dos Advogados Brasileiro - IAB. Segue o teor da carta:






"Prezada Professora Claudia Lima Marques,


Infelizmente não poderei comparecer ao evento do IAB, Audiência Pública para recebimento de sugestões para atualização do Código de Proteção e Defesa do Consumidor que será realizada no dia 19 de agosto do corrente ano.

Assim sendo, solicito que seja portadora da minha posição, especialmente no que concerne ao acesso do consumidor à Justiça. Como sabe, como Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e como Pesquisador e Professor de Direito do Consumidor, sou especialmente dedicado a questões envolvendo a lide consumerista no plano internacional.

O consumidor que firma contratos a distância nacional ou internacional, ou mantém relação jurídica de consumo em geral com fornecedor situado no estrangeiro, ao se deparar com a necessidade de exercer seus direitos em razão de uma lide com o fornecedor, encontra como um dos maiores obstáculos dar efetividade aos seus direitos, em razão da carência de instrumentos processuais. Muito escrevi sobre esse tema e destaco, especialmente, as considerações e sugestões feitas em minha obra “Direitos do Consumidor no Mercosul e na União Européia: acesso e efetividade”.

No entanto, vejo que algumas das modificações sugeridas atualmente para atualizarem o Código de Defesa do Consumidor caminham não para facilitar, mas sim para manter a situação do consumidor numa posição desfavorável, podendo até mesmo piorá-la, especialmente no que concerne a temas de Direito Internacional Privado e Direito Processual Civil Internacional relacionados ao consumidor, ou como contemporaneamente vem sendo denominado na Europa, Direito Internacional Privado de Proteção ao Consumidor. Entre estes temas, área das mais sensíveis é no que concerne a jurisdição internacional, ou competência internacional, nos termos do Código de Processo Civil em vigor.

Os projetos existentes sugerem o seguinte:



1) PL sobre comércio eletrônico:



“Art. 101. .......................................................................

.........................................................................................

§ 1º Na hipótese de fornecimento a distância, nacional ou internacional, em que o consumidor seja pessoa física:

I – a ação poderá ser proposta no foro do domicílio do consumidor;

II – são nulas as cláusulas de eleição de foro e de arbitragem.

§ 2º Os contratos internacionais a distância em que o consumidor seja pessoa física serão regidos pela lei do seu domicílio ou pela norma estatal escolhida pelas partes, desde que mais favorável ao consumidor, assegurando igualmente o seu acesso à Justiça. (NR)”



2) PL sobre superendividamento:

“Art. 51.

VII – determinem a utilização compulsória da arbitragem ou de qualquer forma condicionem ou limitem o acesso aos órgãos do Poder Judiciário;

XXII – prevejam a aplicação de lei estrangeira que limite, total ou parcialmente, a proteção assegurada por este Código ao consumidor domiciliado no Brasil.”



Entre as redações possíveis para o artigo, também vem sendo proposta a seguinte:



“Art. 101. Na ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos e serviços, sem prejuízo do disposto nos Capítulos I e II deste título, serão observadas as seguintes normas:

I - a ação pode ser proposta no domicílio do autor;

II - o réu que houver contratado seguro de responsabilidade poderá chamar ao processo o segurador, vedada a integração do contraditório pelo Instituto de Resseguros do Brasil. Nesta hipótese, a sentença que julgar procedente o pedido condenará o réu nos termos do art. 80 do Código de Processo Civil. Se o réu houver sido declarado falido, o síndico será intimado a informar a existência de seguro de responsabilidade, facultando-se, em caso afirmativo, o ajuizamento de ação de indenização diretamente contra o segurador, vedada a denunciação da lide ao Instituto de Resseguros do Brasil e dispensado o litisconsórcio obrigatório com este.

§ 1º Na hipótese de fornecimento a distância, nacional ou internacional, em que o consumidor seja pessoa física:



I – a ação poderá ser proposta no foro do domicílio do consumidor;

II – são nulas as cláusulas de eleição de foro e de arbitragem.



§ 2º Os contratos internacionais a distância em que o consumidor seja pessoa física serão regidos pela lei do seu domicílio ou pela norma estatal escolhida pelas partes, desde que mais favorável ao consumidor, assegurando igualmente o seu acesso à Justiça.”



A redação do artigo 101, no entanto, para efetivamente representar um avanço e uma atualização do Código de Proteção e Defesa do Consumidor brasileiro, tem que espelhar o que foi consagrado na jurisprudência, em especial na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Como está redigido hoje o artigo, e com as adições sugeridas, o consumidor fica em desvantagem diante do fornecedor.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está cristalizada no sentido de que o foro do domicílio do consumidor é absoluto em todas as lides envolvendo a relação de consumo seja o consumidor autor ou réu. A exceção é quando o consumidor é autor e para ele é mais conveniente ajuizar a ação no foro do fornecedor. Quanto a cláusula de eleição de foro, só é admitida se favorável ao consumidor, o que só pode ser apurado após instaurado o conflito. Também não faz sentido discriminar a pessoa jurídica que está na posição de consumidor, considerando a posição da jurisprudência pátria e a redação do artigo 2o. do Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentido os seguintes arestos:



1) "Acórdão

CC 107441 / SP

CONFLITO DE COMPETENCIA

2009/0161233-0

R elator(a)

Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI (1145)

Ó rgão Julgador

S2 - SEGUNDA SEÇÃO

D ata da Publicação/Fonte

DJe 01/08/2011

D ata do Julgamento

22/06/2011

E menta

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CONTRATO BANCÁRIO. FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. FORO CONTRATUAL. AÇÃO PROPOSTA PELO CONSUMIDOR. RENÚNCIA AO FORO DO DOMICÍLIO. POSSIBILIDADE.

1. Segundo entendimento desta Corte, nas ações propostas contra o

consumidor, a competência pode ser declinada de ofício para o seu

domicílio, em face do disposto no art. 101, inciso I, do CDC e no

parágrafo único, do art. 112, do CPC.

2. Se a autoria do feito pertence ao consumidor, contudo, permite-se a escolha do foro de eleição contratual, considerando que a norma protetiva, erigida em seu benefício, não o obriga quando puder deduzir sem prejuízo a defesa dos seus interesses fora do seu
domicílio.

3. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da 3ª Vara Cível de Porto Alegre - RS.

D ecisão

A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito de competência e

declarou competente o Juízo de Direito da 3ª Vara Cível de Porto

Alegre - RS, o suscitado, nos termos do voto da Sra. Ministra

Relatora. Os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas

Bôas Cueva, Nancy Andrighi, João Otávio de Noronha, Sidnei Beneti, Luis Felipe Salomão, Raul Araújo e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com a Sra. Ministra Relatora."





2) "A córdão

CC 106990 / SC

CONFLITO DE COMPETENCIA

2009/0143424-0

R elator(a)

Ministro FERNANDO GONÇALVES (1107)

Ó rgão Julgador

S2 - SEGUNDA SEÇÃO

D ata da Publicação/Fonte

DJe 23/11/2009

D ata do Julgamento

11/11/2009

E menta

CONTRATO BANCÁRIO. ARRENDAMENTO MERCANTIL. CLÁUSULAS. DISCUSSÃO.COMPETÊNCIA. FORO. ESCOLHA. ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE.

1 - Segundo entendimento desta Corte, tratando-se de relação de

consumo, a competência é absoluta, podendo ser declinada de ofício. Afastamento da súmula 33 do Superior Tribunal de Justiça.

2 - O intento protetivo da lei, no sentido de possibilitar a escolha

do foro, do domicílio do autor ou do réu, dirige-se ao consumidor,

propriamente dito, aquela pessoa física ou jurídica destinatária

final do bem ou serviço. Impossibilidade de o advogado ajuizar a

ação em foro diverso, que não é nem o da autora (consumidora) e nem o do réu (Banco), usando, ao que tudo indica, conforme as instâncias de origem, endereço fictício.

3 - Conflito conhecido para declarar competente o Juízo de Direito

da 1ª Vara Cível de Aranraguá - SC, suscitante.

D ecisão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da

Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do conflito de competência e declarar competente o Juízo de Direito da 1ª Vara Cível de Araranguá/SC, o suscitante. Os Ministros Aldir Passarinho Junior, João Otávio de Noronha, Sidnei Beneti, Luis Felipe Salomão, Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS) e Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP) votaram com o Ministro Relator. Ausentes, justificadamente, o Ministro Paulo Furtado (Desembargador convocado do TJ/BA) e, ocasionalmente, a Ministra Nancy Andrighi."







3) "RECURSO ESPECIAL Nº 1.049.639 - MG (2008/0085005-8)

RELATOR : MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA

RECORRENTE : ANA JULIA PRISCO E OUTRO

REPR. POR : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS CONSUMIDORES DE CRÉDITO - ANDEC

RECORRIDO : HIPERCARD - BANCO MÚLTIPLO S/A


EMENTA

DIREITO CIVIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE ADESÃO. ARTIGO 535, II, CPC. VIOLAÇÃO. NÃO-OCORRÊNCIA.EXAME DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME NA VIA DO RECURSO ESPECIAL. COMPETÊNCIA TERRITORIAL ABSOLUTA. POSSIBILIDADE DE DECLINAÇÃO DE COMPETÊNCIA. AJUIZAMENTO DA AÇÃO. PRINCÍPIO DA FACILITAÇÃO DA DEFESA DOS DIREITOS. COMPETÊNCIA. FORO DO DOMICÍLIO DO CONSUMIDOR.

1. Não há por que falar em violação do art. 535 do CPC quando o acórdão recorrido, integrado pelo julgado proferido nos embargos de declaração, dirime, de forma expressa, congruente e motivada, as questões suscitadas nas razões recursais.

2. Refoge da competência outorgada ao Superior Tribunal de Justiça apreciar,em sede de recurso especial, a interpretação de normas e princípios de natureza constitucional.

3. O magistrado pode, de ofício, declinar de sua competência para o juízo do domicílio do consumidor, porquanto a Jurisprudência do STJ reconheceu que o critério determinativo da competência nas ações derivadas de relações de consumo é de ordem pública, caracterizando-se como regra de competência absoluta.

4. O microssistema jurídico criado pela legislação consumerista busca dotar o consumidor de instrumentos que permitam um real exercício dos direitos a ele assegurados e, entre os direitos básicos do consumidor, previstos no art. 6º, VIII, está a facilitação da defesa dos direitos privados.

5. A possibilidade da propositura de demanda no foro do domicílio do consumidor decorre de sua condição pessoal de hipossuficiência e vulnerabilidade.

6. Não há respaldo legal para deslocar a competência de foro em favor de interesse de representante do consumidor sediado em local diverso ao do domicílio do autor.

7. Recurso especial não-conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso especial nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."





4)"A córdão

REsp 1089993 / SP

RECURSO ESPECIAL

2008/0197493-1

R elator(a)

Ministro MASSAMI UYEDA (1129)

Ó rgão Julgador

T3 - TERCEIRA TURMA

D ata da Publicação/Fonte

DJe 08/03/2010

D ata do Julgamento

18/02/2010

E menta

RECURSO ESPECIAL - CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO, INSERIDO EM CONTRATO DE ADESÃO, SUBJACENTE À RELAÇÃO DE CONSUMO - COMPETÊNCIA ABSOLUTA DO
FORO DO DOMICÍLIO DO CONSUMIDOR, NA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE DA CLÁUSULA - PRECEDENTES - AFERIÇÃO, NO CASO CONCRETO, QUE O FORO ELEITO ENCERRE ESPECIAL DIFICULDADE AO ACESSO AO PODER JUDICIÁRIO DA PARTE HIPOSSUFICIENTE - NECESSIDADE - RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

I - O legislador pátrio conferiu ao magistrado o poder-dever de

anular, de ofício, a cláusula contratual de eleição de foro,

inserida em contrato de adesão, quando esta revelar-se abusiva, vale dizer, dificulte a parte aderente em empreender sua defesa em juízo, seja a relação jurídica subjacente de consumo, ou não;

II - Levando-se em conta o caráter impositivo das leis de ordem

pública, preponderante, inclusive, no âmbito das relações privadas,

tem-se que, na hipótese de relação jurídica regida pela Lei

consumerista, o magistrado, ao se deparar com a abusividade da

cláusula contratual de eleição de foro, esta subentendida como

aquela que efetivamente inviabilize ou dificulte a defesa judicial

da parte hipossuficiente, deve necessariamente declará-la nula, por

se tratar, nessa hipótese, de competência absoluta do Juízo em que

reside o consumidor;

III - "A contrario sensu", não restando patente a abusividade da

cláusula contratual que prevê o foro para as futuras e eventuais

demandas entre as partes, é certo que a competência territorial (no

caso, do foro do domicílio do consumidor) poderá, sim, ser derrogada pela vontade das partes, ainda que expressada em contrato de adesão (ut artigo 114, do CPC). Hipótese, em que a competência territorial assumirá, inequivocamente, a natureza relativa (regra, aliás, deste critério de competência);

IV - Tem-se, assim, que os artigos 112, parágrafo único, e 114 do

CPC, na verdade, encerram critério de competência de natureza

híbrida (ora absoluta, quando detectada a abusividade da cláusula de eleição de foro, ora relativa, quando ausente a abusividade e,

portanto, derrogável pela vontade das partes);

V - O fato isoladamente considerado de que a relação entabulada

entre as partes é de consumo não conduz à imediata conclusão de que a cláusula de eleição de foro inserida em contrato de adesão é

abusiva, sendo necessário para tanto, nos termos propostos,

perscrutar, no caso concreto, se o foro eleito pelas partes

inviabiliza ou mesmo dificulta, de alguma forma, o acesso ao Poder

Judiciário;

VI- Recurso Especial parcialmente provido.

D ecisão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima

indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas

taquigráficas a seguir, a Turma, por unanimidade, dar parcial

provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro

Relator. Os Srs. Ministros Sidnei Beneti, Vasco Della Giustina

(Desembargador convocado do TJ/RS) e Paulo Furtado (Desembargador convocado do TJ/BA) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi."



No que tange a arbitragem, não é admissível cláusula compromissória prévia e vinculante em desfavor do consumidor. Deve, portanto, permanecer o disposto no artigo 51, VII, do Código de Defesa do Consumidor, mesmo porque, a Lei de Arbitragem, n. 9.307/96, no seu artigo 4o., parágrafo 2o., dispõe: “Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula.”

Por todo exposto, sugiro a seguinte redação para o artigo 101:



Art. 101. Na ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos e serviços, inclusive na hipótese de fornecimento a distância nacional e internacional, sem prejuízo do disposto nos Capítulos I e II deste título, serão observadas as seguintes normas:

I – nas demandas nas quais o consumidor for parte e que versem sobre relações de consumo em geral, será competente o foro do domicílio do consumidor;

II – a critério do consumidor, manifestado expressamente no momento em que a demanda for ajuizada, também serão competentes o foro de domicílio do fornecedor, o foro do local da execução do contrato, ou o foro de eleição;

III – o réu que houver contratado seguro de responsabilidade poderá denunciar a lide ao segurador, vedada a intervenção do Instituto de Resseguros do Brasil. Nesta hipótese, a sentença que julgar procedente o pedido condenará réu e denunciado nos termos do artigo 80 do Código de Processo Civil. Se o réu estiver falido, o sindico deverá informar sobre a existência de seguro de rersponsabilidade, facultando-se o ajuizamento da ação diretamente contra o segurador, vedada a intervenção na lide do Instituto de Resseguros do Brasil.

Parágrafo Único. Os contratos internacionais a distância serão regidos pela lei do domicílio do consumidor, ou pela norma estatal eleita pelas partes desde que mais favorável ao consumidor.



Sendo estas as minhas considerações e sugestões, agradeço a atenção e aguardo notícias sobre a reunião.

Cordialmente,

Eduardo Antônio Klausner

Bacharel em Direito, Mestre e Doutor em Direito Internacional e da Integração Econômica pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ; Juiz de Direito Titular da 7ª Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital - Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro; Professor de Direito do Consumidor da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro – EMERJ, e Professor convidado nos Cursos de Pós-graduação em Direito do Consumidor da UCAM e da PUC – RJ.





terça-feira, 6 de setembro de 2011

A CONDUTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO EM DISCUSSÃO

Considerando que a proposta do blog é instruir, divulgar e discutir temas sobre Direito e Justiça, a notícia abaixo merece uma reflexão profunda dos operadores do direito sobre ética profissional/funcional.



• 05/09/2011
• Rio
Para cumprir metas, Estado do Rio arquiva 96% dos inquéritos de homicídio

O comissário de polícia Domingos Lopes caprichou no relatório: "Nas investigações surgem bastantes indícios do envolvimento no crime por parte de Valdilene, Sandro, Roberto, Marcelo Barbosa e Ademir Siqueira". Diferentemente da maioria dos inquéritos de Santa Cruz, na Zona Oeste do Rio, a delegacia surpreendeu ao apontar os suspeitos da morte do guarda municipal Marcelo Caetano da Costa. O comissário queria novas diligências, mas o promotor do caso, Sérgio Pinto, foi implacável. Em abril, quatro anos depois do relatório, ele concluiu: "Fato não testemunhado, autoria ignorada. Pelo arquivamento".
O caso de Marcelo Caetano, assassinado a tiros dentro de casa, em abril de 2005, é um dos 6.447 inquéritos de homicídios arquivados em apenas quatro meses (abril a julho) pelo Ministério Público do Rio de Janeiro. Esse caso, porém, só não cairá no esquecimento porque um juiz não aceitou a decisão. Mas outras muitas mortes ficarão sem esclarecimentos para que o MP fluminense possa cumprir a Meta 2, uma determinação do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) para que todos os inquéritos de homicídios dolosos abertos até 2007 sejam concluídos ainda este ano.
Quando a Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp) estabeleceu a meta, o objetivo era combater a impunidade, sacudindo a poeira de 140 mil inquéritos abandonados nos cartórios policiais do país. Na prática, porém, os promotores optaram por arquivar em massa, em vez de investir mais nas investigações, para chegar a dezembro com prateleiras vazias.
Nos primeiros quatro meses de Meta 2, os MPs do país já arquivaram 11.282 casos e ofereceram denúncia em apenas 2.194. O Rio é o segundo maior arquivador: pediu o encerramento de 96% dos casos examinados. O estado fluminense, só superado por Goiás (97%), tem mais da metade de todos os inquéritos arquivados no Brasil por causa da Meta 2.
Entre as vítimas, pobres são maioria
O exame de uma amostra dos inquéritos que tiveram esse destino, numa das quatro varas do Tribunal do Júri da capital, revela que alguns promotores, para zerar o acervo, estão ignorando evidências ou arquivando investigações que nem chegaram a começar em inquéritos que se resumem à mera troca de carimbos entre a delegacia e o MP.
Em abril, quando o trabalho começou, o Rio acumulava 47.177 inquéritos em aberto. As vítimas eram, geralmente, moradores de áreas pobres e violentas, muitos deles com anotações criminais, presas preferenciais dos grupos de extermínio que agem nesses lugares. Na pressa de reduzir a pilha, alguns promotores cometeram erros crassos, facilmente descobertos no exame de páginas que provavelmente nem foram abertas para ensejar a decisão pelo arquivamento.
O servente Geílson Gomes de Carvalho, de 35 anos, foi retirado de casa e morto a pauladas por traficantes de Vigário Geral em 22 de junho de 1998. Convencida por um papa-defuntos, a então companheira da vítima, Maria do Carmo David de Souza, mentiu na delegacia ao dizer que Geílson, na verdade, fora atropelado. Ela queria receber o seguro do DPVAT, mas a armação foi desmascarada pelo irmão do morto, Joaquim de Carvalho, que confirmou e descreveu o crime.
Além de não apurar a fraude, a 39 Delegacia Policial (Pavuna) se esqueceu de retirar da capa do inquérito a classificação de "atropelamento", embora a própria fraudadora tivesse reconhecido a mentira em novo depoimento anexado ao volume. Em 9 de agosto deste ano, a promotora Andréa Rodrigues Amin pediu o arquivamento do caso. Motivo: prescrição por extinção de punibilidade, por se tratar de um "atropelamento" cuja pena máxima seria de quatro anos.
Andréa Amin, procurada pelo GLOBO, reconheceu o erro. Disse que não leu, realmente, as peças do inquérito que revelavam a fraude. Mas disse que, mesmo se tivesse lido e constatado o homicídio, teria pedido o arquivamento. A promotora, titular da 29 Promotoria de Investigação Penal (Pavuna, Vicente de Carvalho, Acari e outras áreas violentas), padece com 3.300 inquéritos da Meta 2 em aberto:
- Trabalho com duas delegacias que ainda não são delegacias legais. Os policiais, envelhecidos e mal pagos, ainda trabalham com máquinas de escrever. Se as famílias das vítimas não ajudarem, não há como chegar aos autores.
- Ajudar? Meu filho, você sabe onde moro? - reagiu a parente de uma das vítimas citadas, moradora da borda de uma favela, que prefere mesmo ver o inquérito arquivado, caso a polícia e o MP não encontrem os autores por conta própria.
Alguns promotores já desenvolveram métodos para arquivamentos em massa. É o caso de Janaína Marques $êa. Num conjunto de pedidos negados por juízes do TJ-RJ, aparecem 11 casos em que a decisão de Janaína era exatamente igual, mudando só o nome da vítima. Em nota, ela alegou que os textos são iguais porque "os fundamentos são os mesmos".
Uma característica se repete em praticamente todos os casos de arquivamento selecionados pelo jornal: os inquéritos são magros e se resumem à troca de carimbos entre a delegacia, que sempre pede mais prazo quando o atual está prestes a vencer, e os promotores, que os concede. De carimbo em carimbo, os casos acabam atingindo a prescrição, para alívio de todos. É menos um na prateleira.
O garçom Alexsander Lima Batista, de 22 anos, e o servente Alexandre Chaves do Nascimento, de 28, foram executados no dia 20 de janeiro de 2006 em Vicente de Carvalho. Como muitos outros, o caso parecia seguir a rota dos carimbos quando um comunicado reservado da Ouvidoria da Polícia ofereceu uma luz no fim do túnel: apontava (com detalhes) um grupo de extermínio liderado por um sargento da PM como responsável pelos assassinatos.
No início de agosto, a promotora Janaína decidiu que o melhor a fazer, sobre o caso, era esquecê-lo. Pediu o arquivamento alegando que "foram efetuadas diligências com o intuito de apurar o fato, sem contudo lograr-se êxito". No entanto, o exame do inquérito atesta que, mesmo depois do comunicado, a polícia não fez uma única diligência para apurar o caso.
O número de arquivamentos tende a crescer. Sérgio Pinto, que arquivou o caso do guarda municipal de Santa Cruz, admite que no último mês já pediu o mesmo para outros 292 casos. Ele defende a medida:
- Estamos arquivando para que os novos inquéritos detenham atenção especial em sua elucidação.
SP: tribunal arquiva 1.500 inquéritos
A prática de arquivar antecede a Meta 2. No 1 Tribunal do Júri de São Paulo, que concentra mais da metade dos casos de homicídio da cidade, só no ano passado foram arquivados 1.500 inquéritos. A grande maioria deles, cerca de 90%, é arquivada por falta de informações sobre a autoria do crime. E a maior parte desses crimes acontece em bairros pobres, em meio a famílias sem condição financeira ou social para clamar por Justiça.
O juiz Renato Chequini conta que, quando essas mortes ocorrem, seja por acertos de dívidas de drogas ou crimes cometidos em favelas e ruas, é raro haver investigação criminal. O juiz também se queixa da falta de uma política de proteção às testemunhas, o que inibe os depoimentos.
- Se a família da vítima for pobre, a chance de arquivamento é enorme. A testemunha protegida no Brasil é um caso de ficção, assim como o país não tem a cultura da polícia técnica. Quando um inquérito começa a ir e voltar, com papéis de um lado e outro, é sinal de que será arquivado - diz o juiz.

Fonte: O Globo